Publicado
por
O 51º Dia Mundial das
Comunicações Sociais será celebrado, este ano, no dia 28 de maio, Ascensão do
Senhor. Porém, por tradição, a mensagem é divulgada pelo papa Francisco no dia
de São Francisco de Sales, patrono dos escritores e jornalistas, comemorado em
24 de janeiro. “Comunicar esperança e confiança no nosso tempo” é o tema
da mensagem apresentada por Francisco que propõe um estilo “aberto e criativo”
para comunicar esperança.
No comunicado, o papa
encoraja a todos que trabalham neste campo para que comuniquem de modo
construtivo, isto é, rejeitando preconceitos e promovendo uma cultura do
encontro.
Na mensagem, Francisco
ressalta que o protagonista da notícia não pode ser o mal – que nos leva à
apatia, ao desespero e a anestesiar a consciência –, mas a solução aos problemas,
com um estilo comunicador aberto e criativo. “Num sistema comunicador onde
vigora a lógica de que uma notícia boa não desperta a atenção, e por
conseguinte não é uma notícia, e onde o drama do sofrimento e o mistério do mal
facilmente são elevados a espetáculo, podemos ser tentados a anestesiar a
consciência ou cair no desespero”, reflete Francisco.
A realidade não tem um
significado unívoco, afirma o papa. “Tudo depende do olhar com que a
enxergamos, dos ‘óculos’ que decidimos pôr para ver: mudando as lentes, também
a realidade aparece diferente. Portanto, o ponto de partida bom para ler a
realidade é a Boa Notícia por excelência, ou seja, o Evangelho de Jesus
Cristo”, escreveu o pontífice.
Esta boa notícia, explica,
não é boa porque nela não se encontra sofrimento, mas porque o próprio
sofrimento é vivido num quadro mais amplo, como parte integrante do amor de
Cristo ao Pai e à humanidade. Em Cristo, Deus fez-Se solidário com toda a
situação humana, revelando-nos que não estamos sozinhos, porque temos um Pai
que nunca pode esquecer os seus filhos.
Leia a mensagem na íntegra
MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO
PARA O 51ª DIA MUNDIAL DAS
COMUNICAÇÕES SOCIAIS
Tema: “Não tenhas medo, que
Eu estou contigo” (Is 43, 5).
“Comunicar esperança e
confiança, no nosso tempo”
Graças ao progresso
tecnológico, o acesso aos meios de comunicação possibilita a muitas pessoas ter
conhecimento quase instantâneo das notícias e divulgá-las de forma capilar.
Estas notícias podem ser boas ou más, verdadeiras ou falsas. Já os nossos
antigos pais na fé comparavam a mente humana à mó da azenha que, movida pela
água, não se pode parar. Mas o moleiro encarregado da azenha tem possibilidades
de decidir se quer moer, nela, trigo ou joio. A mente do homem está sempre em
ação e não pode parar de “moer” o que recebe, mas cabe a nós decidir o material
que lhe fornecemos (cf. Cassiano o Romano, Carta a Leôncio Igumeno).
Gostaria que esta mensagem
pudesse chegar como um encorajamento a todos aqueles que diariamente, seja no
âmbito profissional seja nas relações pessoais, “moem” tantas informações para
oferecer um pão fragrante e bom a quantos se alimentam dos frutos da sua
comunicação. A todos quero exortar a uma comunicação construtiva, que,
rejeitando os preconceitos contra o outro, promova uma cultura do encontro por
meio da qual se possa aprender a olhar, com convicta confiança, a realidade.
Creio que há necessidade de
romper o círculo vicioso da angústia e deter a espiral do medo, resultante do
hábito de se fixar a atenção nas “notícias más” (guerras, terrorismo,
escândalos e todo o tipo de falimento nas vicissitudes humanas). Não se trata,
naturalmente, de promover desinformação onde seja ignorado o drama do
sofrimento, nem de cair num otimismo ingénuo que não se deixe tocar pelo
escândalo do mal. Antes, pelo contrário, queria que todos procurássemos
ultrapassar aquele sentimento de mau-humor e resignação que muitas vezes se
apodera de nós, lançando-nos na apatia, gerando medos ou a impressão de não ser
possível pôr limites ao mal. Aliás, num sistema comunicador onde vigora a
lógica de que uma notícia boa não desperta a atenção, e por conseguinte não é
uma notícia, e onde o drama do sofrimento e o mistério do mal facilmente são
elevados a espetáculo, podemos ser tentados a anestesiar a consciência ou cair
no desespero.
Gostaria, portanto, de dar a
minha contribuição para a busca dum estilo comunicador aberto e criativo, que
não se prontifique a conceder papel de protagonista ao mal, mas procure
evidenciar as possíveis soluções, inspirando uma abordagem propositiva e
responsável nas pessoas a quem se comunica a notícia. A todos queria convidar a
oferecer aos homens e mulheres do nosso tempo relatos permeados pela lógica da
“boa notícia”.
A boa notícia
A vida do homem não se reduz
a uma crônica asséptica de eventos, mas é história, e uma história à espera de
ser contada através da escolha duma chave interpretativa capaz de selecionar e
reunir os dados mais importantes. Em si mesma, a realidade não tem um
significado unívoco. Tudo depende do olhar com que a enxergamos, dos “óculos”
que decidimos pôr para a ver: mudando as lentes, também a realidade aparece
diversa. Então, qual poderia ser o ponto de partida bom para ler a realidade
com os “óculos” certos?
Para nós, cristãos, os
óculos adequados para decifrar a realidade só podem ser os da boa notícia:
partir da Boa Notícia por excelência, ou seja, o “Evangelho de Jesus Cristo,
Filho de Deus” (Mc 1, 1). É com estas palavras que o evangelista Marcos começa
a sua narração: com o anúncio da “boa notícia”, que tem a ver com Jesus; mas,
mais do que uma informação sobre Jesus, a boa notícia é o próprio Jesus. Com
efeito, ao ler as páginas do Evangelho, descobre-se que o título da obra
corresponde ao seu conteúdo e, principalmente, que este conteúdo é a própria
pessoa de Jesus.
Esta boa notícia, que é o
próprio Jesus, não se diz boa porque nela não se encontra sofrimento, mas
porque o próprio sofrimento é vivido num quadro mais amplo, como parte
integrante do seu amor ao Pai e à humanidade. Em Cristo, Deus fez-Se solidário
com toda a situação humana, revelando-nos que não estamos sozinhos, porque
temos um Pai que nunca pode esquecer os seus filhos. “Não tenhas medo, que Eu
estou contigo»” (Is 43, 5): é a palavra consoladora de um Deus desde sempre
envolvido na história do seu povo. No seu Filho amado, esta promessa de Deus –
“Eu estou contigo” – assume toda a nossa fraqueza, chegando ao ponto de sofrer
a nossa morte. N’Ele, as próprias trevas e a morte tornam-se lugar de comunhão
com a Luz e a Vida. Nasce, assim, uma esperança acessível a todos, precisamente
no lugar onde a vida conhece a amargura do falimento. Trata-se duma esperança
que não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações
(cf. Rm 5, 5) e faz germinar a vida nova, como a planta cresce da semente caída
na terra. Visto sob esta luz, qualquer novo drama que aconteça na história do
mundo torna-se cenário possível também duma boa notícia, uma vez que o amor
consegue sempre encontrar o caminho da proximidade e suscitar corações capazes
de se comover, rostos capazes de não se abater, mãos prontas a construir.
A confiança na semente do
Reino
Para introduzir os seus
discípulos e as multidões nesta mentalidade evangélica e entregar-lhes os
“óculos” adequados para se aproximar da lógica do amor que morre e ressuscita,
Jesus recorria às parábolas, nas quais muitas vezes se compara o Reino de Deus
com a semente, cuja força vital irrompe precisamente quando morre na terra (cf.
Mc 4, 1-34). O recurso a imagens e metáforas para comunicar a força humilde do
Reino não é um modo de reduzir a sua importância e urgência, mas a forma
misericordiosa que deixa, ao ouvinte, o “espaço” de liberdade para a acolher e
aplicar também a si mesmo. Além disso, é o caminho privilegiado para expressar
a dignidade imensa do mistério pascal, deixando que sejam as imagens – mais do
que os conceitos – a comunicar a beleza paradoxal da vida nova em Cristo, onde
as hostilidades e a cruz não anulam, mas realizam a salvação de Deus, onde a
fraqueza é mais forte do que qualquer poder humano, onde o falimento pode ser o
prelúdio da maior realização de tudo no amor. Na verdade, é precisamente assim
que amadurece e se entranha a esperança do Reino de Deus, ou seja, “como um
homem que lançou a semente à terra. Quer esteja a dormir, quer se levante, de
noite e de dia, a semente germina e cresce” (Mc 4, 26-27).
O Reino de Deus já está no
meio de nós, como uma semente escondida a um olhar superficial e cujo
crescimento acontece no silêncio. Mas quem tem olhos, tornados limpos pelo Espírito
Santo, consegue vê-lo germinar e não se deixa roubar a alegria do Reino por
causa do joio sempre presente.
Os horizontes do Espírito
A esperança fundada na boa
notícia que é Jesus faz-nos erguer os olhos e impele-nos a contemplá-Lo no
quadro litúrgico da Festa da Ascensão. Aparentemente o Senhor afasta-Se de nós,
quando na realidade são os horizontes da esperança que se alargam. Pois em
Cristo, que eleva a nossa humanidade até ao Céu, cada homem e cada mulher
consegue ter “plena liberdade para a entrada no santuário por meio do sangue de
Jesus. Ele abriu para nós um caminho novo e vivo através do véu, isto é, da sua
humanidade” (Heb 10, 19-20). Através “da força do Espírito Santo”, podemos ser
“testemunhas” e comunicadores duma humanidade nova, redimida, “até aos confins
da terra” (cf. At 1, 7-8).
A confiança na semente do
Reino de Deus e na lógica da Páscoa não pode deixar de moldar também o nosso
modo de comunicar. Tal confiança que nos torna capazes de atuar – nas mais
variadas formas em que acontece hoje a comunicação – com a persuasão de que é
possível enxergar e iluminar a boa notícia presente na realidade de cada
história e no rosto de cada pessoa.
Quem, com fé, se deixa guiar
pelo Espírito Santo, torna-se capaz de discernir em cada evento o que acontece
entre Deus e a humanidade, reconhecendo como Ele mesmo, no cenário dramático
deste mundo, esteja compondo a trama duma história de salvação. O fio, com que
se tece esta história sagrada, é a esperança, e o seu tecedor só pode ser o
Espírito Consolador. A esperança é a mais humilde das virtudes, porque
permanece escondida nas pregas da vida, mas é semelhante ao fermento que faz
levedar toda a massa. Alimentamo-la lendo sem cessar a Boa Notícia, aquele
Evangelho que foi “reimpresso” em tantas edições nas vidas dos Santos, homens e
mulheres que se tornaram ícones do amor de Deus. Também hoje é o Espírito que
semeia em nós o desejo do Reino, através de muitos “canais” vivos, através das
pessoas que se deixam conduzir pela Boa Notícia no meio do drama da história,
tornando-se como que faróis na escuridão deste mundo, que iluminam a rota e
abrem novas sendas de confiança e esperança.
Vaticano, 24 de janeiro –
Memória de São Francisco de Sales – do ano de 2017.